Ontem fui para a rua logo pela manhã, com um grupo de amigos de loucuras e ternuras, amigos que não precisam ser do sangue para já fazerem parte da minha família.
Podia ser um dia igual a outro qualquer, em que saímos de casa por volta das 8.30 e fomos rua abaixo, rua acima pelos caminhos de Lisboa cidade, Lisboa menina!
Algo aconteceu neste dia, uma iniciação, uma transformação, não vos sei dizer. Dia 1 de Junho, dia da criança, mas afinal dia da criança são todos os dias, pois eu tento, a cada momento que passa, amar a minha criancinha , cuidar dela, dar-lhe um mimo, um colo, um presente. Aliás muitas vezes sinto que estou mais em estado de criança, do que de adulto.
É tão simples, ou será tão mais verdadeiro, mais espontâneo, mais perto de nós, da nossa verdadeira essência. Não sei!
Mas não, não foi por ser dia da criança. As pessoas olhavam para nós de forma estranha, uns sorriam e desejavam também um bom dia, outros fingiam que não nos viam, e desviavam o olhar, meio encavacados, como se…fossemos seis malucos fugidos do hospital Júlio de Matos (o suposto hospital dos “malucos” em Lisboa). Outros faziam um ar sério, quase zangado, como se quissessem dizer: “ arrgg, não se cheguem perto, não ousem sequer dizer-me bom dia senão mordo”. Outros apenas balbuciavam: “grandes otários…”
Mas nós, como que guerreiros que sentem ter uma missão para cumprir continuámos rua acima, rua abaixo com a nossa espada na boca! Um sorriso e um “bom dia com alegria!”.
Fiquei surpreendida por ver que as pessoas que mais interagiram connosco foram senhoras mais velhotas. Velho para mim simboliza tempo, e tempo é sabedoria.
Na mística zona da Graça, parámos junto da dona Odete, a mulher das flores. Que senhora, que energia! Brincou connosco como se brinca com as crianças, que mulher tão cheia de garra e com tanta ternura! A Dona Odete, tinha junto de si uma amiga, não lhe perguntámos o nome, mas eu vou chamar-lhe a senhora dos chupas. Mais uma querida mulher que riu connosco, que simplesmente se deixou levar pela energia, e no fim da nossa brincadeira foi ao café, logo ali ao lado, e comprou um chupa para cada um de nós: “ tomem, minhas queridas criancinhas, vocês merecem estes chupas!”.
Outra senhora ainda, dentro do café onde fomos beber um sumo de laranja, ofereceu-nos um saquinho de caramelos de fruta.
E assim seguimos rua abaixo, até à rua Augusta. Surpreendeu-me ver que as crianças com mais de 7 anos, simplesmente ignoravam o nosso sorriso, como se não fosse possível, um grupo de adultos como nós, parecerem simplesmente crianças, como se adultos, não pudessem mais ser crianças. Mas…no fundo estes menino(a)s só estavam a cumprir aquilo que os pais lhes dizem, e lhes mostram. Hoje em dia há um excesso de trabalho e de “ir”responsabilidade, e muita falta de tempo para os pais brincarem com as crianças, e simplesmente se entregarem ao mundo da magia e da fantasia dos seus filhos.
“ Vejam lá se crescem depressa!” - disseram-nos alguns adolescentes; “Espero que voltem para o ano e passem por aqui, quero vê-los novamente!” - duas senhoras mais “sábias” disseram; e na rua Augusta fizemos um circulo com algumas crianças corajosas que não tiveram vergonha de se juntar a um grupo de adultos “malucos” e dançámos em circulo cantando e rindo.
Rua acima, rua abaixo, cantámos, fizemos adeus às pessoas dos eléctricos e autocarros e desejámos um bom dia com alegria a todos os que passaram por nós!
Foi uma manhã mágica, foi uma verdadeira iniciação, foi uma aprendizagem, foi uma brincadeira! Fui eu mesma, sem medo, sem vergonha, sem preconceitos. Sem dúvida, para o ano vou repetir!
Será que foi por irmos para a rua de pijamas e camisas de dormir, de chinelos, com a almofada debaixo do braço, a escova de dentes na mão, uma fralda e uma chucha na boca.
Será???